Resultados do 6º Concurso Poético

Resultados do 6º Concurso Poético
Cancioneiro Infanto-Juvenil Para a Língua Portuguesa

Entre outros do Grupo 5- Maiores de 21 anos:

João Bosco da Silva, 24 anos, Torre Dona Chama, Mirandela - As Memórias
Do Amanhã Longínquo

http://www.ipiaget.org/cancioneiro-infanto-juvenil/premiados/grupo-5.pdf

Revista INÚTIL #2. Dia 16 de Abril na Livraria Buchholz, Rua Duque de Palmela, nº 4, Lisboa, às 21.00h.

A apresentação estará a cargo de Filomena Cautela. As leituras de textos e poemas serão feitas por actores convidados e contamos também com a presença dos músicos Bernardo Sassetti - convidado central, Mário Franco (contrabaixo) e Alexandre Frazão (bateria).

Com a colaboração do vosso conterrâneo com o poema "Lixeira".

Caretos



A máscara a abrir a porta para a liberdade,
Grotesca, a pôr um véu no humano coberto de franjas,
Que já não o é, porque é mais: É sagrado porque é pagão.
É o fim de um ser e o início de outro.
É a porta entre dois mundos.
É o que vem e o que foi, neste que é.
Um nu colorido e barulhento a chocalhar pelas ruas
Da terra atrás das raparigas férteis e disponíveis.
É a festa da renovação, uma oração à natureza,
Um pedido à terra para que traga um ano bom.
As chamas levam o passado,
Por que tudo o que já não, é inútil, não faz crescer,
Há que purificar a terra para o devir.
O Inverno não dura sempre, mesmo que volte,
Cá estaremos para o ano.
Um presente eterno, mesmo que longe do início,
Mesmo que os avós mortos e os filhos por nascer,
Também eles foram, também eles serão.
Hoje nós o presente, a eternidade mascarada,
Protegidos do mundo dos outros dias,
Donos da porta que é o tempo.
Amanhã os facanitos a olhar-nos por detrás da máscara,
E nós à espera que nos abram a porta,
Mas hoje nós o que eles querem ser um dia,
Os que têm as chaves todas, a chocalhar.
Hoje somos os arautos da natureza,
Da vida que ela dá e tira.
O animal preso durante todo o ano,
Finalmente livre, como um diabo aos saltos,
Com licença sem pedido concedida, porque hoje é o dia eterno.
Hoje duas caras. Hoje as chaves para todas as portas.
Hoje dia da liberdade mais pura.
Com uma paz violenta a fazer mal sem maltratar,
Ninguém pode levar a mal aos deuses por um dia.
Venha o barulho e a confusão,
O caos de uma rajada de vento a levantar as saias,
Ou uma vara se ele faltar,
Porque hoje somos nós que abrimos a porta.
Venha a geada e o frio a despedir o ano,
Que nós de um mundo entre mundos,
De um tempo entre tempos.
Donos e senhores de todas as chaves do universo,
Do universo comum, da ruralidade de onde a humanidade nasceu,
Fiel e transcendente, com origem na origem,
Nas fornalhas do tempo, quando o homem nu,
Com franjas e uma márcara de madeira ou couro,
Atrás das portas para abrir o futuro à humanidade.
Hoje os males dos homens e dos deuses longe,
Protegidos por uma mística imunidade,
Com uma misteriosa força que faz as pernas saltar,
A garganta gritar, livremente, pelas ruas da terra fora,
Atrás do que se gosta mais:
Raparigas solteiras.
Hoje fazemos a regra: haja liberdade!

14.03.2010

Savonlinna

João Bosco da Silva

R.I.P. Joãozinho




Que interessa o que o mundo,
Quando o teu mundo só teu?
Cumpriste como só tu podias cumprir,
O que esperavam de ti era só o que eles esperavam.
Só porque um caminho menos escolhido, errado?
Putos idiotas, todos, porque tu da idade do tempo.
Quantas gerações se tornaram aborrecidas,
Enquanto tu ainda a festejar, bêbedo mas a festejar.
Putos parvos quando crescem e se tornam sérios,
Sérios amargos cheios de ressentimento porque o tempo os obrigou
A ser adultos sérios e responsáveis.
Sérios são os mortos quando não morrem a sorrir.
Amanhã não quero morrer que é festa,
Haverá a festa, mas tu já não estarás,
Porque a tua festa, que foi a vida, acabou.
Puto, diz-me ele, vós é que estais todos mortos.

13.02.2010

Savonlinna

João Bosco da Silva

"CONTOS CARDEAIS"



São quarenta e mais os contistas que relataram os contos que traziamdentro de si, marcando um ponto nos seus e nossos percursos, desafiandoa voz da lua e trazendo-a para a luz da existência nas páginas dosCONTOS CARDEAIS.


"É Sempre Tão Difícil Para Os Homens!", João Bosco da Silva

Lista

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ao menino jesus

Quero correr pelos montes até o meu cheiro se confundir
Com o das giestas, das urzes, da resina dos pinheiros, dos pinheiros,
Do musgo fresco, da terra aberta, dos carvalhos, das rochas húmidas,
Dos animais que deixaram rasto, dos que se cruzam comigo,
Do húmus, dos cardos e dos fetos,
Do covil escondido, dos ninhos, das asas que se abrem no ar,
Do que ardeu no verão passado e renasce!

Quero jantar com os amigos que me fizeram,
Comer uma posta mal passada de vitela ainda a sangrar, criada nas redondezas,
Pelo avô de alguém conhecido, com batatas fritas arrancadas pelos dentes metálicos
De alguém honesto e por isso com calos nas mãos,
Perto da lareira do restaurante da beira da estrada!
Quero arroz doce para sobremesa, quase como o da minha avó,
Quase como o da minha mãe, mas sem os desenhos com o pó de canela!
Quero acabar com a cerveja fresca do tasco de uma aldeia pequena,
Fazer dela o mundo todo de uma noite!
Quero gritar sem camisa no meio do asfalto, ignorando outras presenças que não
A dos que me fizeram.

Quero entrar numa mulher portuguesa e que ela me entre dentro,
Me sinta além do corpo, além do verde dos olhos que por vezes mentem,
Como todos os olhos de gente e goste de mim porque sou tão vulgar!
Quero dar-lhe o mundo todo numa noite e se sobrar algo de mim,
Deixar que cresça no amanhã para quem vier!

Quero estar no café da terra até fechar, beber e conversar com os que bebem e vivem,
Comungar de uma cerimónia mais sincera e real pela noite dentro,
Conversando sobre o que vagamente conhecemos e é o que temos,
Gozando com a miséria que é a mais miserável das coisas,
Mestres das coisas simples da vida!
Quanta sabedoria desconhecida numa cerveja entre amigos,
Da que não se ensina na escola: na escola não ensinam a felicidade!

Quero ler Miguel Torga com geada da manhã trasmontana além da janela,
Junto à lareira com as brasas que saltam ameaçadoras, violentas contra as pantufas de avô,
Com uma torrada de pão centeio na mão, brilhante do açucar!
Quero sentir-me no que ele escreveu, acreditar que sou capaz e especial,
Apesar de ter nascido da esterilidade da rocha de granito!

Quero atravessar o Marão num autocarro de carreira,
Dos que estão sempre atrasados e por isso não vale a pena correr por eles,
Demorar quatro horas porque cai neve, sem me importar porque estou mais perto do céu!
Quero olhar de cima as aldeias pequenas com a sua gente grande
A lutar pela vida, a viver, ignorando que eu de cima a passar, a imaginar que vida!

Quero comer um salpicão assado na brasa na cozinha dos meus avôs,
Com os pingos do fumeiro que seca como chuva gordurosa e animal,
Mais divina que outra impossível!
Quero passar o serão a jogar à bisca dos nove com o meu avô,
Ignorando a sua batota anciã, até à hora de ir dormir numa cama que foi de um dos tios da França!
Quero acordar cedo e caminhar pelos caminhos de gente e animais
Em direcção às montanhas que nunca chegam,
Até a um lameiro com erva fresca onde possa deitar-me e apagar a minha sede de Anteu!


12.12.2009

Savonlinna

João Bosco da Silva